Torturas, altas dose de medicamentos controlados e desumanidade. O que era para ser um local de acolhimento revelou-se um “inferno” para os internos da Comunidade Terapêutica Filhos de Maria, que foi interditada após operação coordenada pelo Núcleo de Atenção à Saúde (NAS) e pelo Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos.
O local operava de forma irregular na capital e a ação revelou graves violações, incluindo cárcere privado, sequestro e lesão corporal.
De acordo com as informações, a intervenção foi parte de um esforço contínuo da Defensoria Pública para investigar denúncias de irregularidades em clínicas e comunidades terapêuticas. A defensora pública Eni Maria Sezerino Diniz, coordenadora do NAS, informou que o local já estava sob monitoramento devido a relatos de tortura, maus-tratos e supermedicação dos internos. “A inspeção foi um desdobramento natural do nosso trabalho”, destacou.
A Defensoria atuou em conjunto com o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), que, junto à equipe da Defensoria, inspecionou a clínica.
Durante a ação, foram encontradas 95 homens vivendo em condições degradantes, muitos dopados e sem atendimento médico adequado. “Não havia médicos, psicólogos ou assistentes sociais. A única profissional presente era uma enfermeira, enquanto os internos apresentavam ferimentos e doenças sem qualquer suporte adequado”, relatou Eni Diniz.
Além do resgate imediato dos pacientes, a Defensoria acionou diversos órgãos para garantir uma resposta eficaz às violações. O Conselho Regional de Farmácia foi mobilizado para autuar a situação irregular relacionada a um grande estoque de medicamentos controlados.
A Polícia Civil também foi acionada, enviando uma equipe para colher depoimentos e iniciar investigações. O proprietário da clínica foi levado à delegacia para prestar esclarecimentos.
A atuação da Defensoria foi decisiva na articulação com a Secretaria de Assistência Social e a Subsecretaria de Direitos Humanos do município, que estiveram presentes no local para garantir o retorno dos pacientes às suas famílias. A defensora pública Thaisa Raquel Medeiros de Albuquerque Defante destacou que muitos internos estavam sendo mantidos contra a sua vontade, com alguns sendo removidos irregularmente de suas casas em outras cidades.
A Defensoria Pública tem um papel fundamental na proteção da dignidade humana, conforme ressaltou a coordenadora do Nudedh. “Nosso trabalho não termina com a identificação das violações; garantimos que os responsáveis sejam responsabilizados e que as vítimas recebam o tratamento adequado”, afirmou.
Encaminhamentos foram realizados após a operação, incluindo a autuação do local pelo Conselho Regional de Farmácia e a instauração de um procedimento investigativo pela Polícia Civil.
A Defensoria também coordenou o encaminhamento dos pacientes a unidades de acolhimento ou de volta às suas famílias, em colaboração com as autoridades municipais.
Esta operação é mais um desdobramento da atuação contínua da Defensoria, que recentemente desmantelou outra clínica psiquiátrica irregular em Campo Grande. Em julho do ano passado, a Defensoria descobriu um “manicômio clandestino” que apresentava condições desumanas, como tortura e ausência de prescrições médicas adequadas. Na Justiça, a Defensoria obteve a proibição da clínica de receber novos pacientes e a remoção de publicidade enganosa sobre os “serviços” oferecidos.